22 fevereiro 2014

Nola, um dos centros mais antigos do Cristianismo





Nápoles é uma das cidades mais fascinantes da Europa. Romântica, atraente e caótica, a cidade possui um extraordinário patrimônio artístico e cultural. 

Seguindo de Nápoles em direção às montanhas chega-se a Nola, que na antiguidade teve grande destaque por ser uma das mais ricas e prestigiadas cidades da região.





Shopping Vulcano Buono

Situada numa planície fértil, Nola está ao nordeste do vulcão Vesúvio, que é considerado atualmente um dos mais perigosos do mundo devido a sua tendência a erupções explosivas.

O vulcão tornou-se famoso pela erupção ocorrida no ano 79, que resultou na destruição das cidades romanas de Pompéia e Herculano com as quais Nola mantinha estreita ligação.






Foi o Vesúvio que serviu de inspiração para os arquitetos que criaram o shopping de Nola. Junto ao parque industrial está o Vulcano Buono, um dos cinco shoppings do mundo com ousada arquitetura. O que o diferencia dos demais é o seu formato moderno que se assemelha a um vulcão.





Situado numa ampla área, com muitas lojas, cinema, restaurantes e um elegante hotel 4 estrelas, a parte externa é coberta com vegetação mediterrânica se destacando no meio de um amplo estacionamento.



Museu Arqueológico / Anfiteatro de Nola


Nola possui um valioso patrimônio histórico, que pode ser admirado em seus sítios arqueológicos,  igrejas e museus. 

No Museo Archeologico de Nola, que funciona num antigo mosteiro de 1521, há um vasto material que reconta o desenvolvimento da cidade, obras de arte sacra e diversos achados arqueológicos que evidenciam o esplendor vivido em tempos passados.

Várias relíquias da era pré-histórica dividem espaço com pinturas da era moderna, enquanto grandes vitrines exibem diversos objetos da vida cotidiana dos antigos etruscos, gregos e romanos. 

Habitada desde os tempos pré-históricos, Nola surgiu numa época antes da fundação de Roma, a partir de uma comunidade etrusca que convivia com os gregos de Neapolis ou Nápoles, até ser conquistada pelos Samnitas.




T
orricelli, mausoléu romano

Chamada nos tempos antigos de Uri ou Hyria, das ruínas da antiga cidade destruída nasceu Nola. O nome da cidade está associado ao termo Osco Nuvla, que significa "cidade nova", numa época em que os Oscos disputavam a posse da região com os etruscos.

Os Oscos tinham uma cultura de adoração à divindade Mamerte e, ao serem dominados, os romanos herdaram sua cultura e passaram a adorar o deus Marte num templo que lhe era dedicado em Nola. 

Historiadores citam ainda que nas imediações de Nola existia no século 2 a.C. um templo dedicado a Hércules, o grande heroi da mitologia grega.





Anfiteatro romano

Por estar situada entre o mar e a montanha, possuir um solo fértil para a agricultura e ser uma passagem do comércio entre Nápoles e outras cidades, a cidade era cobiçada pelos romanos com os quais Nola mantinha rivalidades. 

Depois um longo cerco, em 312 a.C. a cidade se tornou uma das bases do exército romano durante a Segunda Guerra Púnica, trazendo grande desenvolvimento econômico e destaque para a cidade.

Na época existia um grande anfiteatro com capacidade para 20.000 pessoas e era um dos mais prestigiados da região devido às feiras, apresentações artísticas e combates entre gladiadores. 

A decadência da cidade iniciou no século 1 e por um longo tempo a cidade teve um acentuado declínio. Foi arrasada por Spartacus, o célebre gladiador da cidade de Cápua que comandou a revolta de 100.000 escravos contra os romanos nos anos 70  

Terremotos e erupções vulcânicas trouxeram muita destruição. Também foi o foco de diversas invasões pelos vândalos, sarracenos e húngaros que devastaram o resto da cidade.  





Portal de entrada da cidade 


O destino de Nola mudou a partir de 1269, quando o Rei de Nápoles concedeu algumas terras da região de Nola a Guy de Manfort, em reconhecimento à sua bravura e coragem demonstrada nas batalhas.

Guy de Manfort era um guerreiro a serviço do rei e tinha vindo da Inglaterra após a morte de seu pai e irmãos. Foi excomungado pelo papa por ter vingado a morte de seus parentes e citado no Canto XII da obra "Divina Comédia" de Dante.

Ao casar-se com uma herdeira da nobreza Aldobrandeschi, Guy de Manfort teve duas filhas: Tomasina e Anastasia, porém foi capturado na costa da Sicilia em 1287 e morreu na prisão. 

Após a morte de seu pai, Anastasia que era a primogênita e já tinha 19 anos, foi nomeada Condessa de Nola. Em 1293 casou-se com Romano Orsini, dando início ao Condado dos Orsini em Nola.



         


Corteo degli Orsini

A cada ano a cidade realiza o Corteo degli Orsini, um desfile que faz uma reconstituição histórica da época dos condes Orsini em Nola. Trajando ricas e belas roupas medievais, o desfile começa no Palazzo Orsini sob o repicar de todos os sinos e passa pelas principais ruas da cidade. 

Os personagens do desfile representam o conde, a condessa, a nobreza, cavaleiros, damas, bispos, monges, clérigos, juízes, soldados, armeiros etc. O desfile é acompanhado por músicos, poetas, dançarinos e trovadores e termina na Catedral onde todos são abençoados. 

Durante três dias há diversos eventos medievais, como danças, serenatas recitadas, simulação de combates e o tabuleiro vivo de xadrez.O mercadinho relembra as antigas profissões medievais e oferece produtos típicos da época medieval. 

Nas tabernas pode-se degustar receitas medievais acompanhadas por um copo de ippocrasso, que é um vinho aromatizado. A próxima edição da festa será realizada entre o final de maio e princípio de junho de 2014.





Palazzo Orsini ou Reggia Orsini

A família Orsini continou o trabalho de recuperação da cidade iniciado por Guy Monfort e construiu importantes monumentos, mosteiros, igrejas e palácios, entre eles o Palazzo Orsini que é uma das construções de destaque de Nola.

Chamado de Reggia Orsini, o palácio de três andares foi construído entre os anos de 1480-1500 na Piazza Giordano Bruno para ser a residência dos condes Orsini. A fachada é simples e coberta de mármore, mas possui um fino acabamento com esculturas.

Em 1558 foi doado aos jesuítas pela esposa de Henri Orsini, o último conde de Nola. Na época a condessa financiou a construção da igreja ao lado, onde está o seu túmulo. Duzentos anos depois o palácio foi ocupado para uso militar e atualmente é usado pelo Tribunal de Nola.






Palazzo del Fascio

No lado oposto da praça está a Igreja de San Biagio, que Niccolò Orsini mandou construir em 1372 e onde está seus restos mortais. Ao lado da igreja está o Palazzo del Fascio construído em 1938 na época facista na Itália. 

O palácio era uma espécie de secretaria de finanças de Nola e hoje é usado pela Faculdade de Direito. Ainda resta na praça a antiga porta que dava acesso à cidade além de outros antigos palácios.




Piazza Giordano Bruno


Na praça há um monumento dedicado a Giordano Bruno, também chamado de Bruno de Nola por ter nascido na cidade em 1548. 

Ele era doutor em teologia, matemática, filosofia, mas suas ideias foram consideradas muito avançadas para sua época. 

Bem antes de Galileu, Giordano Bruno já falava sobre a teoria da relatividade e citava algo que depois se tornaria a Teoria da Evolução de Darwin.

Filiado ao Hermetismo, Giordano Bruno estudava astrologia, aprovava a teoria de Copérnico de um universo centrado no sol e defendia a ideia de um universo infinito e povoado por uma infinidade de estrelas e planetas. 

Em seus escritos Giordano Bruno dizia que o Sol era maior que a Terra, comentava sobre a existência de vida inteligente fora da Terra e questionava alguns dogmas da igreja.

Devido às suas ideias, Giordano Bruno foi acusado de heresia, magia e bruxaria sendo condenado pela inquisição à morte na fogueira. 

Obrigado a ouvir a sentença ajoelhado, teve a voz de suas verdades caladas por um objeto de madeira colocado em sua boca. Sua execução ocorreu numa praça central de Roma em 17 de fevereiro de 1600 e suas cinzas foram jogadas no rio Tibre.





Prédio da prefeitura de Nola

Nola também teve uma importante participação na história política da Itália. Foi em Nola que surgiram os primeiros movimentos dos Carbonari ou Carvoeiros a partir de 1814, tendo sido um dos mais importantes movimentos de base popular da Itália que deu origem à unificação da Itália.

Os Carbonari faziam parte de uma sociedade secreta e revolucionária, que tinha um foco patriótico para mudar a situação política na Itália. Como outras sociedades secretas da época, os Carbonari tinham uma cerimônia de iniciação com complexos símbolos e tratavam-se como "primo".

Os membros da sociedade eram recrutados principalmente junto à nobreza, altos cargos e pequenos proprietários, tendo posteriormente alcançado outras classes e se espalhado por todo o país. As revoltas carbonárias foram reprimidas, mas a unificação da Itália tornou-se uma realidade alguns anos depois.





Villa Comunale



Villa Comunale

Passear pela cidade significa descobrir muitos monumentos, tal como a Villa Comunale que é um parque de Nola construído sobre uma antiga torre medieval em 1884. 

Decorado com fontes e monumentos entre a área verde, um pequeno templo com colunas tem a imagem de San Felice cuja mão se dirige para o Vesúvio como se protegesse Nola da fúria do vulcão.





Monumento aos mortos na guerra



Monumento Ottaviano Augustus

Uma das praças é marcada pelo monumento dedicado aos mortos nas guerras, enquanto em outra há um monumento dedicado ao imperador romano Ottaviano Augustus que faleceu no ano 14 em Nola. Após sua morte, o senado romano decretou a sua divinização passando a ser adorado como Divus Augustus.




Complexo de Basílicas em Cimitile 

O Cristianismo tinha em Nola um dos centros mais antigos e importantes da vida religiosa: o Cemitério Cristão de San Felice em Cimitile. 

O perímetro da antiga cidade de Nola era delimitado por muralhas e torres, que hoje não são reconhecíveis.

Ao longo do tempo, a necrópole assumiu a aparência de uma cidade fora das muralhas de Nola, tendo influenciado na construção da importante estrada romana Via Popilia.
 
De todos os monumentos do cristianismo primitivo, o complexo de basílicas de Cimitile é o mais famoso dos tempos antigos. 

Trata-se de 13 basílicas cristãs, santuários e cemitérios da época medieval, construídas entre os séculos 3 a 5 e decorados com afrescos e mosaicos. 

É um dos exemplos mais notáveis da arte cristã primitiva, que testemunhou a transição entre o paganismo e o cristianismo.






O Cimitile Antiquarium está dentro do complexo arqueológico das basílicas, contendo em exposição diversos objetos e dados sobre sua história. 

O "Coemeterium" foi escolhido para receber os funerais consulares e imperial, substituindo o conceito do enterro em propriedades privadas. 

Os elementos que distinguiam os túmulos cristãos de outros pagãos, eram as decorações e imagens simbólicas. Foi assim que nasceram os mausoléus.

O complexo foi construído devido às contínuas peregrinações ao túmulo de San Felice, o primeiro bispo de Nola que foi sepultado num local ocupado por uma necrópole pagã. 

O período de maior desenvolvimento do complexo ocorreu entre os anos 395 a 409, quando San Paolino foi viver lá como um monge e depois se tornou bispo. 

Até o século 14 a Catedral de Nola funcionava no Complexo Cimitile, tendo mudado para o centro da cidade com a transferência do bispado.




Igreja dell'Immacolata



Igreja S.M. Jacobi

Em Nola há diversas igrejas, conventos e oratórios nas vielas, que revelam a religiosidade de seu povo. Algumas delas são: a Igreja dell'Immacolata e a Igreja de S.M.Jacobi, que são dignas de serem admiradas, tanto por sua arquitetura quanto por seu valor histórico.





Catedral de Nola

A Catedral de Nola dedicada a Santa Maria Assunta al Cielo foi originalmente construída no século 14, tendo sido reconstruída no século 19. 

As escadarias acessam uma varanda com arcos  sustentados por pilastras e decorada com nichos com imagens. É na catedral que estão os restos mortais de San Paolino, que foram transferidos para a  cripta da catedral em 1909.





San Paolino/Padroeiro de Nola

A maior demonstração da fé acontece durante a Festa dei Gigli ou Festa dos Lírios, que é dedicada a San Paolino e cujas origens remontam ao século 5 logo após sua morte em 431. É uma das festas mais espetaculares de Nola, que movimenta a cidade durante vários dias no mês de junho. 

Nascido de uma rica e nobre família francesa, San Paolino foi um escritor e poeta. Se converteu a fé cristã, renunciou de seus bens materiais, estabeleceu-se em Nola e tornou-se bispo. 

Quando os hunos provenientes da África invadiram a Itália, todos os homens da cidade foram levados como escravos. San Paolino prometeu ir até a África e se oferecer em troca de um dos prisioneiros.

Durante seu cativeiro San Paolino conquistou a confiança dos hunos tornando-se um escravo pessoal do líder. Por tê-lo alertado sobre um iminente perigo, San Paolino foi libertado junto com todos os outros escravos.

Retornou para a Itália levando ainda um carregamento de grãos. Em gratidão, o povo de Nola foi recebê-lo com lírios.




Festa dei Gigli

Após a  morte de San Paolino, o povo sempre lhe fazia uma homenagem com lírios que eram colocados junto de uma base que tinha a imagem do santo. 

Entretanto durante a Idade Média surgiram divergências sobre as homenagens entre sapateiros, padeiros, açougueiros, lavradores, alfaiates e viticultores. Algum tempo depois, artistas e artesãos começaram a projetar altares mais altos.





A partir do século 17 a música foi incorporada às homenagens e criou-se a tradição da Festa dei Gigli ou Festa dos Lírios,  que permanece até os dias atuais, tendo sido reconhecida pela Unesco como Patrimônio Imaterial da Humanidade. 

Os Gigli ou Lírios são oito obeliscos de madeira com 25 metros de altura e cobertos por acabamentos artísticos, havendo ainda uma estrutura na forma de um barco que representa o retorno de San Paolino do cativeiro.





Cullatori di Nola no desfile na Festa dei Gigli

Numa na ordem tradicional, os Gigli percorrem as ruas estreitas do centro histórico despertando o júbilo da população e encantando turistas. 

As estruturas são carregadas nos ombros por um grupo de aproximadamente 120 homens, chamados Cullatori, que são guiados por um "capoparanza" ou o chefe da paranza.






A paranza é um tipo de agremiação de pessoas que constroem e coordenam o desfile. Com grande habilidade e, mesmo diante do grande peso, os Cullatori dançam, movem e giram a estrutura ao ritmo música que vem de uma banda encima da estrutura enquanto percorrem as estreitas ruas do centro histórico.

Alguns estudiosos tendem a relacionar essa tradição como a repetição de um antigo ritual pagão, quando grandes árvores, que simbolizam a fertilidade, eram carregadas durante uma procissão para obter boa sorte durante o solstício de verão.








Alguns Cullatori de Nola foram retratados pelo fotógrafo italiano Antonio Busiello. Ao carregarem os pesados obeliscos de madeira, esses guardiões da antiga tradição criam grandes calos nos ombros.

Porém eles se sentem-orgulhosos por terem um símbolo de sua devoção a San Paolino. Isso não desestimula os jovens, que a cada ano se mostram felizes por participar dessa homenagem ao padroeiro da cidade...







13 fevereiro 2014

Porto Viro, a capital do Delta del Pó no Veneto







Chamado pelos antigos gregos de Eridanus, o rio Po nasce na divisa com a França e percorre todo o norte da Itália. 

Antes de chegar à sua foz na região do Vêneto, o rio se divide em centenas de canais e cinco cursos principais formando o grande Delta del Pó no encontro com o Mar Adriático.







Delta del Po

Através do tempo essa região passou por inúmeras mudanças, seja através da intervenção humana, seja pelas inundações provocadas pelos rios. É a maior área inundada da Europa, tornando o Delta um patrimônio natural extraordinário.






Abrangendo dois parques regionais, um no Vêneto e outro na Emilia Romagna, o cenário multicolorido é encantador. 

O azul do céu claro se reflete no rio e se mistura com o verde da exuberante vegetação pontilhada pelas cores das aves. Quem passa a noite num dos hotéis da região, tem o privilégio de acordar com a sinfonia do canto de centenas de aves.






No outono, torna-se especialmente marcante para quem observa os pássaros com seus voos espetaculares sobre as águas. 

Devido à sua grande extensão com diversas ramificações do rio, lagoas e uma vasta vegetação, o Delta del Pó tornou-se o abrigo ideal para milhares de aves, mamíferos, répteis e peixes.






Pequenos barcos e canoas trafegam pelas estreitas passagens entre os juncos e levam a bancos de areia, onde numerosas colônias de aves aportam nas faixas de terra que se formam na maré baixa.

A presença de aves é tão reveladora, que fazem do Delta o mais importante parque ornitológico italiano, onde centenas de ornitólogos montam seus equipamentos nessa época para captar as melhores imagens dos pássaros.






É no Delta que as aves provenientes de diversos lugares chegam para fazer seus ninhos, como a garça com seu voo lento que mais parece obedecer a uma coreografia, os mergulhões, rouxinóis, andorinhas, gaivotas, patos, marrecos e outras aves migratórias, que tornam o Delta um cenário de rara beleza.






As excursões ao longo das seis ramificações do rio Pó revelam os mistérios da vida selvagem e permitem descobrir a maravilhosa história que envolve essa região. 

Navegar pelo Delta del Po significa descobrir lugares inesquecíveis e ter a mesma sensação que sentiram os venezianos que habitaram essas terras há pelo menos 3.000 anos atrás.






Depois vieram os etruscos, gregos e os romanos que criaram a Via Popilia em 132 a.C. ligando Ravenna a Aquileia, que foi a primeira colônia romana da região. 

Foram esses povos que desenvolveram a pesca e as salinas dando ao Vêneto o controle total do comércio na antiguidade.

Considerado um lugar mágico que se transforma a cada época, percorrer o Delta significa descobrir  uma das mais esplêndidas paisagens da Europa. 

Na primavera as belas cores da natureza invadem todo o delta e no verão lhe dá um toque brilhante. Nas lagoas típicas das salinas onde a salinidade é superior, em determinadas épocas surgem flores que colorem o Delta de lilás.





Polesine

O Polesine, chamado de Pulésan no dialeto ferrarese, é o nome dado à região da província de Rovigo situada entre os cursos dos grandes rios Adige e Pó, sendo o local onde a maior parte de água doce dos rios flui para o mar. 

O termo Polesine surgiu de Pollicinum na época medieval, que significa terra pantanosa e foi definido pelo Ducado de Ferrara que governou a região entre 1200 a 1500.






Na época o Duque Ercole D'Este I encomendou um projeto de recuperação das terras pantanosas e expandiu o Delta, porém entrou em confronto com Veneza em 1482, cujo conflito ficou conhecido como a Guerra do sal. Apesar de ser hoje um produto de baixo valor, na antiguidade o sal foi motivo de verdadeira obsessão e guerras.





O sal: a riqueza da terra

Extraído principalmente das águas do mar, o sal tornou-se imprescindível para a vida humana quando os povos incluíram os vegetais na alimentação. Essencial para a conservação de alimentos, na antiguidade o sal adquiriu valor de moeda e alvo da cobiça de governantes. 

De tão essencial, os romanos garantiam aos plebeus o direito ao sal, cujo lema era "Sal para todos". Foi nessa época que surgiu o nome Salada, que significava o costume de salgar os vegetais.

A ausência do saleiro numa mesa romana era um sinal de inimizade. E tinha tanto valor que os soldados eram pagos sal, de onde vem o termo Salário. 

O sal ganhou maior importância na Idade Média devido à ambição de alguns membros da Igreja Católica. Vários monastérios eram localizados ao lado de minas de sal e muitas cidades surgiram próximas de campos de extração salina; Roma é um exemplo.






Veneza era um Estado independente e não produzia sal, mas deve boa parte de sua beleza aos lucros com a intermediação do comércio do sal. Embora a Sereníssima República de Veneza detivesse o monopólio do comércio de sal, Ferrara controlava as salinas de Comacchio.

Durante muito tempo o Papa Sisto IV - o pai da inquisição - ambicionava tomar as terras de Ferrara para incorporá-la ao patrimônio de sua família.

Apesar do papa ter mudado de ideia, Veneza continuou a guerra. Sem anuência do papa, Veneza selou um tratado de paz com o Ducado de Ferrara obrigando a entrega da região de Rovigo e o Delta do Pó a Veneza.

O Papa não ficou satisfeito com os termos do tratado e, diante de sua ira violenta, teve um ataque cardíaco e morreu em 1484. Em 1597 o último Duque de Ferrara faleceu sem deixar herdeiros diretos. Esse foi o pretexto usado pelo Papa Clemente VIII para se apossar da cidade e expulsar o resto da família Este de Ferrara.





Corte de Porto Viro 

Temendo que as sedimentações pudessem aterrar a lagoa de Veneza e seu comércio através da navegação, nobres venezianos que tinham investido na região de Veneza resolveram desviar o curso do rio. Assim foi realizada uma impressionante obra de desvio do curso principal do rio Po.

A colossal obra não teve igual realizada naquela época. Ninguém poderia acreditar que seria possível conceber e tornar viável tal empreendimento, abrindo um canal com mais de 7 km de extensão.  O corte de Porto Viro foi realizado entre 1600 a 1604, redesenhando o Delta del Pó.

Na época surgiram muitas lendas a respeito do desvio do rio, mas na verdade desde a descoberta das Américas em 1492 as rotas comerciais que tinham tornado Veneza uma potência tinham sido alteradas. Com o declínio do comércio marítimo, nobres venezianos foram obrigados a criar novas fontes de renda.





Contarina/Donada

Utilizando a fortuna que tinham acumulado por meio do comércio, os nobres venezianos investiram em terras agrícolas. Foi a partir dessa época que dois nobres e ricos venezianos, Contarini e Donà, obtiveram a concessão de uma área na província de Rovigo próxima a Veneza.

A nobre e tradicional família Contarini era uma das famílias venezianas mais influentes, tendo em seu clã personalidades eclesiásticas, políticas e militares. 

Eles tinham inúmeras propriedades e cofres cheios de riquezas que guardavam em casa. Eram tão ricos que emprestavam dinheiro para a metade do povo da Europa, por isso ninguém se atrevia a atacá-los.

Ao construírem seus palácios próximos ao rio, dali surgiram as aldeias de Contarina e Donada. Três séculos depois as duas comunidades tornaram-se parte do Império Austríaco e foram unificadas, recebendo o nome de Taglio di Porto Viro.

Passado alguns anos, devido ao crescimento da cidade e temendo a força política de Porto Viro, por decreto imperial de 1937 a cidade foi novamente dividida recriando as cidades de Contarina e Donada. 

Em 1 de janeiro de 1995, por um referendum popular, as cidades foram novamente unificadas recriando a antiga cidade de Porto Viro.





Porto Viro  

É a principal cidade do Delta del Pó, onde as cores, fragrâncias e aromas caracterizam um ambiente único. Situada às margens do Rio Pó, a cidade é silenciosa e tranquila, onde é possível caminhar ou pedalar lentamente uma bicicleta por suas ruas planas.



 


As várias praças são marcadas por monumentos e belos palácios, como a prefeitura na Piazza della Reppublica que marca o centro exato entre Contarina e Donada. 

Caminhando pela cidade descobre-se extraordinárias construções e várias igrejas que mostram a marcante religiosidade dessa região.






Igreja Santa Maria della Chiesa

Atualmente a celebração da festa da padroeira de Porto Viro é realizada todos os anos em 11 de outubro, mas nem sempre foi assim. Segundo contam, quando ocorreu a fusão das duas cidades havia uma dúvida qual seria o santo padroeiro da cidade.

San Bartolomeo era o padroeiro de Contarina e Santa Maria della Visitazione a padroeira de Donada. Para resolver o impasse foi escolhida a Igreja dedicada a Santa Maria della Chiesa.

Situada numa praça muito espaçosa, a celebração da padroeira inclui, além das celebrações religiosas, outros eventos culturais e esportivos, terminando com a degustação de produtos típicos da região.





Igreja Santa Maria della Visitazione de Donada

A Piazza Marconi é ladeada por palácios e tem no centro a bela Igreja de Santa Maria della Visitazione com sua torre sineira. Construída em 1858, ao lado existe um monumento dedicado aos mortos nas guerras.




Igreja San Bartolomeo de Contarina

Na Piazza Mateotti está a Igreja de San Bartolomeo. Construída pela família Contarini no século 18, a igreja possui três painéis de um autor desconhecido que ilustram a vida, o martírio e a glória do santo.

No interior da igreja há cinco capelas com altares em mármore veneziano, aproveitados da antiga igreja que foi demolida sob as ordens de Napoleão e que situava-se bem perto da atual, quase em frente ao complexo da Villa Contarini.





Villa Contarini / Carrer

Na bela construção atualmente funciona o sofisticado Hotel Villa Carrer, sendo um dos preferidos por turistas que estão em viagem pela região.

A vila foi construída no século 18 pela família Contarini para dar emprego a muitos camponeses numa época de crise e desemprego. Em 1817 a propriedade foi transferida para a família Nicoletti. Após o casamento de Gina Nicoletti com Gaetano Carrer a villa adotou o nome de Carrer. 






Gaetano pertencia a uma família de grande cultura e em sua sala estar foram recebidas importantes personalidades da época. 

As visitas eram atraídas principalmente pela presença do beato e filósofo Rosmini. Conclamado como um dos maiores pensadores cristãos, em 2007 o Papa Bento XVI aprovou a beatificação de Rosmini. 





Igreja de San Giovanni Battista

Além das famílias Contarini e Donà outros nobres se estabeleceram na região nos anos de 1600, como as famílias Pisani e Cappello que deram nome a alguns lugarejos nas proximidades de Porto Viro. 

Em Cà Cappello está a antiga Igreja de San Giovanni Battista construída no século 17. Ladeada por uma torre sineira, uma parte das estruturas existentes é usada pelo museu etnográfico.





Cà Cappello / 
 / Museo della Corte 

Chamado Museo della Corte, está localizado dentro de um antigo complexo onde foram coletadas as tradições e reconstituídos vários tipos de ambientes típicos da comunidade agrícola Polesine. Há também uma exposição de centenas de aves empalhadas.





Cà Cappello


A construção foi realizada pela nobre família veneziana Cappello. Originalmente cercada por um muro de tijolos, ainda pode-se admirar a casa senhorial, os armazéns e outras construções. Construído num estilo camponês no século 17, o portão da entrada principal ainda contém o emblema da família.





Museo del Miele


Essa é outra atração em Ca' Cappellino, que trata do mundo das abelhas e suas incessantes atividades para a produção do mel, própolis, geleia real e cera de abelha. Situado no interior do Centro de Apicultura, também é usado pelos produtores para extrair e embalar o mel.

O melhor dessa visita é a doce possibilidade de degustar os vários tipos de mel produzidos no Parque Delta del Po. 

No Museu há uma extensa exposição de objetos, velas de cera, objetos feitos de madeira e de taboa, chamada pelos venezianos de paiera. Em setembro é realizado na cidade o Festival de Mel do Polesine.




Arroz do Delta

Devido ao constante alagamento, essa região tornou-se o lugar ideal para o cultivo do arroz, que cresce no rico solo submerso sem adição de fertilizantes.  Há dezenas de empresas que cultivam o arroz e garantem que o arroz dessa região é de melhor qualidade.

Atualmente os extensos arrozais cobrem áreas que no passado foram pantanosas e insalubres. O cultivo começou com a semeadura nos pântanos, mas  graças à visão dos Duques de Ferrara que governavam a região nos anos de 1400, os pântanos foram saneados. Além de evitar doenças como a malária e pelagra, tornou o Polesine um grande cultivador de arroz.

Dizem que "il riso del delta do Pó", por ser cultivado em água saloba, além de ter um grão maior tem também alto teor de proteína, o que o distingue de outros. Essa reputação do arroz do Delta del Pó deu origem às feiras e festivais que se realizam anualmente na região, como a famosa "Giornate del riso del Delta del Pó".





Marina de Porto levante

Através da Via Colombo, passando por extensos campos cultivados, chega-se à Marina de Porto Levante, uma típica vila de pescadores que mantém suas redes de pesca secando ao sol. 





Marina de Po Levante

Situada em meio ao Delta do Pó, é o lugar ideal para quem gosta de estar junto à natureza, ama o mar e adora a pesca em alto mar.  Essa é a melhor maneira de conhecer a realidade da região e saborear pratos típicos do Polesine. 





Cozinha Pula

Há uma significativa quantidade de fazendas e restaurantes espalhados pela região, que são especializados em tradições culinárias. A cozinha Pula é simples, genuína e usa produtos locais com os peixes, frutos do mar, legumes, arroz, além de inúmeras opções de carnes. 

Os pratos de peixes são imperdíveis. Os Polesanos são mestres em grelhar, principalmente o bacalhau. Em cada prato há o aroma e o sabor de uma terra generosa banhada pela força das águas, onde a polenta tem um lugar especial...